Este texto é um convite à reflexão. Num país construído por quem partiu, cresce o medo de quem chega. Como explicar este paradoxo? Talvez a resposta esteja menos nos factos e mais nos fantasmas.
Não conseguimos compreender esta situação absurda de emigrantes e alguns familiares votarem num partido que é contra os emigrantes e os imigrantes. Por isso pedimos ajuda à IA e, olhem, leiamos e reflitamos:
Portugal é um país feito de partidas. Meio milhão de portugueses lá fora, famílias com irmãos, filhos, netos emigrados. Fomos, durante décadas, o povo que atravessava fronteiras com a mala de cartão e um nó na garganta e, ainda hoje, assim é. E, no entanto, cá dentro cresce o apoio a partidos que gritam contra os que chegam. Como se os nossos emigrantes fossem uma coisa e os imigrantes cá dentro fossem outra.
Há aqui uma amnésia coletiva perigosa: esquecemos que também fomos pobres, discriminados, olhados de lado. “Ah, mas nós éramos trabalhadores!” — dizem muitos, como se os que hoje cá chegam não fossem também. E esquecemos que a imigração sempre foi um motor económico, cultural, até humano, para os países que a souberam integrar.
Os partidos que crescem à custa do medo sabem bem o jogo que jogam. Não precisam de provas, só precisam de tocar nas emoções: medo de perder identidade, medo de perder emprego, medo de perder segurança. Não interessa que os dados mostrem o contrário. A política do medo não vive de factos, vive de ressentimentos.
No fundo, apoiar quem fecha portas aos outros é, de certa forma, cuspir para cima da própria história. É esquecer os nossos avós, os nossos pais, os nossos irmãos. Talvez por isso seja tão urgente lembrar: o que hoje és, um dia foste ao contrário. E não há nada mais humano do que reconhecer-se no outro.
O André Ventura será um dia, se o povo português o entender, primeiro-ministro — será. Isto porque cada povo tem o governo que merece.
E não é maravilhoso? Finalmente — se acontecer — vamos ter um governo que nos represente: um governo que saiba sorrir para fora e rosnar para dentro, que saiba construir muros e, se faltar cimento, use os ossos da própria memória. Um governo que, em vez de nos fazer olhar ao espelho, nos venda um espelho partido — perfeito, assim podemos cortar os dedos sempre que tentarmos perceber quem somos.
Porque, no fundo, o medo não nos protege. Só nos aprisiona.
A. M.
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